6 de fev. de 2014

vingança cega... (conto)





“Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de odiar um e amar o outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e a Mamom.” Mateus 6:24

Eu gosto dos evangelhos porque é poesia pura do mais alto nível. Daquelas que séculos de tradução (e traição) não conseguem destruir. Eu acho. Bem, eu assisti uma dessas séries americanas que expunha o dia a dia de uma gangue demotociclistas. A estória deixava revelar que a tal gangue teve um início abnegado e voltado a defender uma pequena cidade de bandidos e malfeitores, mas que com o tempo, e a natural troca de liderança, assumiu um caráter contraventor e um tempo breve depois já adotava a criminalidade pesada mesmo, com tráfico de armas, drogas, exploração de prostituição e assassinatos. Além do que viviam da velha e conhecida escola do tipo olho por olho dente por dente.

Eu não vi mais nenhum episódio porque detesto enredos em que criminosos são heróis e desprezo profundamente me apaixonar por eles, a não ser pelos que se arrependem e passam a combater a própria gênese. Por exemplo, prefiro um desenvolvimento estilo Tarantino em que sempre os maus-caracteres se dão mal... muito mal no final, e ainda, aquele que quer ‘sair dessa vida’ consegue e sai fora na boa (depois de sofrer bastante é claro). Bem, nessa série e neste único episódio, ao qual assisti, um homem havia estuprado uma garota. O pai da garota decidiu fazer justiça pela vingança bruta. Planejou e boquejou que iria capar e matar o cretino do estuprador. Foi até o chefe da gangue das motos e disse o que queria. Os membros da gangue acharam o desgraçado.

Foram até um lugar ermo com o infeliz patético dominado em seus últimos momentos de vida e... o pai da garota, da menina que talvez estivesse precisando da ajuda do seu pai naquele momento horrível pelo qual passava, estava lá... acreditando estar também de todo preparado para a sua vingança justa de ódio, bem alimentado por milhares de justificativas. Na hora do sacrifício o chefe da gangue, óbvio, passou as honras ao pai, porém, o vingador paternal simplesmente não conseguiu realizar a proeza de extirpar, descaroçar, desarrochar, relaxar os bagos do cateto com uma faca de castrar curvada e doída... desde as bolas daquele desacorçoado ali rendido na sua frente até o começo da sua garganta num só corte profundo, sangrento e... peidou.

Tremendo na tremedeira entregou o instrumento da justiça para o chefe machão. Este olhou na cara dele com uma puta raiva e disse que era muito engraçado que o pai quisesse uma vingança naquele estilo, que tinha gritado, berrado que iria matar o cara, mas que saiu vomitando, correndo para longe e que agora um outro é que teria que fazer aquilo que ele mesmo não tinha peito para fazer porque era um bunda mole de um bundalêlê... e que ainda saiu correndo e nem de ver era capaz? E sabiam lá que Gandhi havia dito que nessa pegada o máximo que teremos é um mundo de cegos (e banguelas). Mas, a gangue não adotava os depoimentos de Gandhi porque, até mesmo os brutos ali percebiam, seria uma imensa incoerência, pois, se alguém acredita e atua na violência é isso e o melhor para essa pessoa, por certa honra mental, que esta tenha seus heróis e que estes sejam bem violentos. Já se não é isso. Quais serão os heróis? Matar e amar? Tem alguma moral essa estória? Tem alguma coerência nessa estória?





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