“O fascismo não é impedir-nos de dizer, é obrigar-nos a dizer.” Roland Barthes
Também é fabricar fascinação com poeira medíocre. Talvez por isso as duas palavras tenham a mesma raiz. Porque o fascismo é hoje um arquétipo psicológico e está por aí em nós todos, mas também sempre esteve, e seu trabalho mais eficiente é, e sempre foi, nos fascinar cegamente. É uma coisa diversa da imagem de um ditador gritando no púlpito e massacrando os outros. Esse é a apenas sua literalização máxima. Porém, mesmo esses tiranos enlouquecidos sabiam e afirmavam que os artistas eram os seus insubstituíveis arautos, pois, alguns destes são mestres em fabricar fascinação.
Seguindo essa tradição de obrigar a dizer chegou ao ponto de que hoje em dia até a reclamação foi incorporada. É algo que já não está nem aí se alguém reclama, não dá a mínima pra nossa opinião. Descobriu isso... Para que reprimir? Deixa reclamar. É até bom que reclamem mesmo e até se fabricam canais especiais para a reclamação que nunca vão a lugar nenhum e que ainda instrumentalizam tais reclamações em função da sua própria propaganda. É a partir daí que podemos vislumbrar esse ‘fascismo arquetípico’ nos lugares mais insuspeitos.
Nessa arte que produz a todo vapor e que nos obriga a amá-la sob a mira de metralhadoras de sensibilidade, emoção, amor, verdades e sexo explícito que foram roubados dos filmes de sexo explícito e rodados em ‘filmes de arte’? Os filmes de sexo explícito vão rodar o que agora? Esses novos ditadores do puro que se divertem ao nos ver reclamar como uns loucos espumando pela boca... Que nos fazem ver calada e diariamente que somos os últimos da fila, mas que nos obrigam a tentar ser os primeiros destas filas enormes de estréia, que fazem tudo menos nos permitir ver realmente o filme. Dessas novidades incríveis das caixas de sucrilhos. Que nos faz encontrar sei lá onde uma maneira de agüentar sua tortura e sua dominação asquerosa. Ao inferno com suas glórias fascistas que arrebentam as pessoas por aí!
Nesse filme "La Vie d'Adèle", por exemplo. A opressão da bondade e da suposta civilidade... Mas algo está trêmulo. Quem sabe se alguém estará aí para o que a menina disse nesta entrevista, que sentiu essa pressão sobre si, pois ela é também apenas um instrumento à disposição, como sempre fomos, e que reclame à vontade... Tanto faz. Mas aqui, neste detalhe ingênuo, está revelado tudo o que precisamos entender para além da presunção dessa grandeza transformadora inquestionável da obra sensível. Talvez a menina seja realmente a nossa heroína, mas não por carregar mais uma vez o fardo da tortura nefasta da estética fascista, dissimulada nesse arrojo já tão velhaco do filme, que com certeza ela nem mesmo percebe afinal. O fascínio do prêmio estabiliza tudo, mas, é nossa heroína por ter sobrevivido à sua estupidez absurda e revelado isso tão delicadamente para nos socorrer. Ah! Conseguíssemos realmente perceber o que somos forçados a fazer, o que somos obrigados a gostar e a aplaudir.