23 de jan. de 2023

A lesma e o cavalo (prosa poética)



O tempo é representado sempre na horizontal. Porém, isso é ilusório e só pode ser alegado pela invenção de alguma materialidade objetiva, que simula uma continuidade circularmente plana. Todavia, toda durabilidade revela uma melancolia, pois, se se pode encenar o espaço do passado e do futuro, por outro lado, essa pretensão se distancia da inspiração e da leveza vazia, duma metafísica subjetiva, do presente. Ou seja, na verdade o tempo somente age na vertical, através da reorganização de sua carga, de seu peso possível. Se o engano está na ilusão mórbida de uma lesma num rastro de limbo duma eternidade monótona que nunca acaba, o fato está, ao contrário, na crudeza de um tempo ativo como um cavalo que despeja sua carga de vitalidade, de momento a momento, em que uma outra eternidade, reversa, sem nenhuma relação com qualquer sequência, pois, porque nunca começou e porque nunca terminará, é uma descarga. Sem esse despejamento nunca existiria a cavalgada. O tempo não é uma linha contígua que se arrasta puxando o que já aconteceu e empurrando o que ainda acontecerá. O tempo não passou, não passa e nem passará. O tempo é sustentado, é escorado. Não se realiza no tédio ingênuo por esperá-lo, porém, na força bruta em o suportar.